sábado, 28 de outubro de 2017

Liberdade de pensamento e expressão I




Por Erenildo João Carlos 



Provavelmente, você tenha ouvido e pronunciado afirmações do tipo 'você fala como o homem da cobra', 'você fala pelos cotovelos', ou, ainda, 'parece que você tomou água de chocalho'. Esses são alguns ditos populares que, de um certo modo, indicam o livre exercício do pensamento e da expressão. 

Liberdade praticada em diversos lugares e momentos do cotidiano; em espaços públicos e privados. Liberdade exercida pelos mais diferentes tipos de pessoas, físicas e jurídicas, em situações de conversações dos mais diferentes gêneros. Liberdade amplificada por meio de suportes tecnológicos e midiáticos: livros, jornais, boletins, revistas, imagens, radio, televisão, internet, celulares, tabletes, computadores, blogs, sites, facebook, twitter, instagram.... 

Em face disso, várias questões e desafios podem ser formulados. Vejamos alguns: Quais sãos os limites e possibilidades do exercício da liberdade de pensamento e de expressão? Qual a responsabilidade individual e institucional resultantes dos efeitos e consequências das coisas ditas e escritas? Como distinguir o certo do errado, o verdadeiro do falso no universo dos pronunciamentos? Que atitudes e comportamentos democráticos são necessários para a convivência social pacífica e fraternal entre os que assumem diferentes posições e que expressam conteúdos distintos, muitas vezes, antagônicos em suas manifestações? Os distintos espaços sociais de aprendizagem, a exemplo dos familiares, escolares, empresariais, midiáticos, religiosos, sindicais e partidários, são lugares onde ocorrem a aprendizagem do exercício pleno da democracia ou, lamentavelmente, onde se aprendem posições sectárias, dogmáticas e polêmicas, cuja pratica institucional legitimada acaba por interditar o exercício da liberdade de pensamento e de expressão, bem como a constituição de sujeitos democráticos e fraternos? Cultivamos nesses lugares o exercício do livre pensar e de expressão, do diálogo e do entendimento construtivo, ou da censura, da interdição, da polêmica, do monólogo, da ofensa e do ódio? Se do ponto de vista da ordem jurídico-político constitucional somos um pais democrático, culturalmente poderemos dizer o mesmo?

O fato é que, embora tenhamos muito o que aprender e construir, não vivemos sob a égide de uma sociedade totalitária, do pensamento único, seja ele de cunho ideológico, político, teológico ou mercadológico. 

Portanto, gostemos ou não, concordemos ou não, o fato é que a 'liberdade de pensamento e expressão' é um principio que faz parte da dinâmica cotidiana e institucional das sociedades democráticas. Por isso, mesmo que discordemos do que seja dito, mesmo que nos posicionemos contra o que ouvimos, lemos e vemos; mesmo que consideremos absurdo e inaceitável, duvidoso e mentiroso, imaginário, ficcional e prejudicial o conteúdo das coisas pronunciadas, anunciadas, proferidas, propaladas, difundidas, postas em circulação, defendemos o direito privado e público do dizer e do pensar livre, sem censura. 

Em suma, embora, o conteúdo do que seja dito possa não ser verdadeiro, legitimo, certo e apropriado, a partir de determinada perspectiva, o fato é que, nas sociedades democráticas, existe o direito de dizer 'isto ou aquilo', o direito da livre manifestação do pensamento e da expressão. 

Certamente, não sou a favor da cultura do silêncio, como também não sou do anuncio do ódio e da descriminação. Entretanto, não posso, em nome de minha discordância, proibir quem pensa e diz assim, interditar o seu direito de dizer e de pensar diferente.

Preciso, isto sim, em face desse reconhecimento, aprender a ouvir e a falar, a dialogar e a conviver com os diferentes e os antagônicos, que falam 'como o homem da cobra', 'pelos cotovelos', como quem 'tomou água de chocalho', por conta da observância ao princípio democrático da liberdade de pensamento e de expressão, mas também, e sobretudo, por conta de outro princípio, fundamental a vida humana, o da sociabilidade ética do cuidado e do dizer.