Erenildo J. C.
Movidos pela necessidade de
sobrevivência, pelo desejo de dizer algo, pelos achados encontrados ou
pelo encantamento diante das coisas e dos outros, aprendemos a nos
comunicar, isto é, a dizer algo sobre alguma coisa para alguém.
No curso de nossa história,
inventamos formas diferentes de comunicação: os gestos, os gritos, as falas, os
sinais, as imagens e as escritas são alguns exemplos. Aos poucos, durante um
certo tempo, cada uma dessas produções foi sendo fixada, incorparada e
transmitida de uma geração à outra, foram se tornando patrimônio cultural da
humanidade e atributos do gênero humano.
No desenvolvimento histórico
do ato de falar aprendemos que certas maneiras de dizer comunicam mais ou
menos, melhor ou pior aquilo que se quer dizer. O acúmulo da experiência
comunicativa permitiu subistituir um modo por outro, combiná-los e refiná-los.
Nesse processo, o gesto e o grito foram sendo substituídos pela fala, que
ganhou um lugar fundamental no contexto das relações sociais. Ontem e hoje,
vários povos, etnias, raças e grupos sociais recorreram (e recorrem) a cultural
oral, como meio de comunicação hegemônico. Antes da invenção da escrita,
vivemos milhões de anos imersos no seio da cultura oral e gesticular. A
história dos índios brasileiros é um exemplo do que estamos tratando!
A relevância do
acontecimento da fala em nosso cultura, como uma maneira de dizer algo para
alguém, fez dela não-somente um ato de aprendizagem necessário à mediação da
sociabilidade dos indivíduos e grupos sociais, como também operou um
deslocamento da preocupação da fala para o dizer: o que se diz, as maneiras de
dizer, seus efeitos e seus modos de existência se tornaram objetos do
conhecimento.
Esse fenômeno evidencia uma
necessidade individual e social do aprofundamento da consciência sobre o dizer,
sugerindo à formulação de perguntas do tipo: podemos ter consciência do que
dizemos? Se podemos, quais são os tipos e níveis possíveis de consciência sobre
o dizer? Quais são as estratégias de análise adequadas para atingirmos a consciência
almejada sobre o tipo e o nível do dizer investigado?
Provocadas pelo
acontecimento da fala e do dizer, as perguntas formuladas assinalam, de certo
modo, a relevância da reflexão, do estudo, da pesquisa e do ensino sobre os
dizeres, os ditos, seus efeitos e seus modos de existência que tem sido
empreendido sobre a questão por diferentes ciências, áreas de conhecimento e
práticas culturais: psicologia, sociologia, antropologia, história, filosofia,
neurociência, semiótica, análise do discurso, religião, política, mídia,
pedagogia, educação etc.
O fato é que o par
falar-dizer exige que tenhamos consciêcia de sua complexidade, suas múltiplas
dimensões e implicações. Sobretudo, quando militamos e trabalhamos no sentido
do desenvolvimento de uma consciência crítica e criativa capaz de empoderar o
indivíduo e os sujeitos sociais a dizer o que pensa, sente e vive. Entretanto,
a consciência que pretendemos ter, saber ou constituir está diretamente
relacionada ao aspescto do dizer que elegemos como objeto de nossa preocupação,
a exemplo da consciência enunciativa que desenvolvemos mediante a análise
arqueológica do discurso acionado e articulado pelo falante que diz alguma
coisa sobre algo para alguém.
João
Pessoa, 27 de janeiro de 2013.